"A música e a palavra do fogo encantado, penduradas no cordão da grande feira, anunciam passagem do Palhaço sem Futuro. A combustão do som e os gestos da cena burlesca projetam luzes na pequena lona do circo. O círculo da vida. Declaramos o novo espetáculo do nosso desejo. Assumimos o palhaço como símbolo, com suas pinturas de guerra, seu passado ridículo, sua loucura fingida, sua alma impaciente. Sonho que caminha no mundo sem futuro e que faz do presente o fundamento de existência. Mesmo com a guerra na porta, com a lona rasgada e sob a tempestade sem fim, o espetáculo vai começar!" - Cordel do Fogo Encantado, encarte do CD "Palhaço do Circo sem Futuro"
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Um Palhaço
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Pinto meu rosto com as cores que todos os dias eles vêem no espelho. Faço da minha cara o retrato cruel do ridículo cotidiano de suas vidas. Os sorrisos insossos, as caretas fingidas, a apatia sonolenta. E tudo o que eles sabem fazer é achar tudo engraçado e gargalhar.
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Um Palhaço
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Pinto meu rosto com as cores que todos os dias eles vêem no espelho. Faço da minha cara o retrato cruel do ridículo cotidiano de suas vidas. Os sorrisos insossos, as caretas fingidas, a apatia sonolenta. E tudo o que eles sabem fazer é achar tudo engraçado e gargalhar.
Durante toda uma noite torno-me o próprio absurdo que vejo em cada um deles. Sou a caricatura do mesquinho, do desesperado, do cínico, do inseguro, do suicida. Imito todas suas bobagens, suas vãs tentativas de fingir que estão vivos. E como eles se acabam de rir.
Vou ainda mais longe; na cara de cada uns deles, digo exatamente o que penso de suas idiotices. Mostro a cada um o quão humilhante é estar na pele dele, viver suas pequenas falsas emoções e sobressaltos. Grito que todos eles são uma corja de covardes, sem coragem sequer para assumir a própria farsa. Eles quase caem de suas arquibancadas, riem de se bolar.
Pergunto se eles estão achando se eu sou a porra de um palhaço, e mando todos à merda. O circo quase vem abaixo com as gargalhadas.
E então eu fico sério. Calado, encarando cada um deles. Lentamente, eles percebem que algo está errado, eu deveria estar rindo também, rindo de mim mesmo como eles. Pouco a pouco, eles param de rir, e começam a ficar tensos, desconfortáveis. E começam a se perguntar se tudo aquilo que fiz e disse era sério, se eles eram a piada, e não eu.
E então eu rio com toda a cena. Não posso evitar, é engraçado demais! De repente todos eles percebem que não são nada, que não passam de merda, até cara de merda eles fazem! É demais, eu rolo no chão gargalhando, eu não aguento com isso.
Alguns ainda tentam rir, um sorriso amarelo, sem graça. Disfarçar o mal-estar geral. Mas é tarde, o feitiço já foi feito, e todos eles saem do circo com uma ilusão a menos em suas vidas. E eu termino essa noite com umas risadas a mais.
2 comentários:
nossa, isso foi forte(!). sabe, uma curiosidade, mas, desde pequena eu nunca gostei de palhaços, mas sim sentia,acho,pena... é, era pena... eles não me pareciam engraçados, pareciam sofridos, querendo inistentemente agradar a platéia... e para isso, eles apanhavam, se humilhavam de todo e qualquer jeito, e as pessoas ali rindo daquilo, daquele sofrimento. Tanto é assim que se você chamar alguém de palhaço, na maioria das vezes, a pessoa se ofende, não é?
vou indo entao, abraços.
Tai
seco...vc foi fundo. Sei o que diz. E é só.
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